No mundo todo as pessoas estão sentindo os efeitos das mudanças climáticas na forma de enchentes devastadoras, secas prolongadas, incêndios florestais cada vez mais intensos, tempestades mais violentas, calor extremo e outros eventos. Diante disso, é essencial investir em ações para reduzir e evitar esses impactos. Métodos de construção mais seguros, por exemplo, podem determinar se uma casa resistirá ou não a uma tempestade.

A pergunta essencial é: como pagar por isso?

É aí que entra o financiamento para adaptação.

Principalmente em países de baixa renda, o financiamento para adaptação é primordial para tornar as pessoas – assim como as infraestruturas e os ecossistemas dos quais elas dependem – mais resilientes aos impactos das mudanças climáticas. No entanto, a cada ano que a, a diferença entre os recursos necessários e o que está de fato disponível só aumenta.

Uma vez que as mudanças climáticas continuam a se intensificar, preencher essa lacuna é fundamental. Mas ainda há diferentes definições sobre o que conta como financiamento para adaptação, bem como diferentes formas de fornecer e acompanhar esses recursos. A seguir, respondemos às principais perguntas sobre o assunto.

1) O que é financiamento para adaptação?

O financiamento para adaptação diz respeito aos recursos destinados a ajudar comunidades a reduzir os riscos e os danos que podem sofrer com perigos climáticos como tempestades ou secas. Ele é usado, por exemplo, para reforçar casas e infraestruturas contra eventos climáticos extremos; desenvolver culturas agrícolas resistentes à seca; criar redes de proteção social (como auxílios em dinheiro, alimentos ou seguros que ajudam na recuperação de desastres climáticos); ou melhorar o o à informação climática para uma melhor gestão dos riscos.

O financiamento para adaptação inclui recursos que fluem de países desenvolvidos para países em desenvolvimento, bem como investimentos que governos (tanto de países desenvolvidos quanto em desenvolvimento) fazem para fortalecer a resiliência aos impactos climáticos dentro de seus próprios territórios. Esse tipo de financiamento também pode vir de fontes privadas, como fundações filantrópicas, empresas e instituições financeiras. Um reflexo disso é que cada vez mais empresas têm investido em adaptação para proteger suas operações, cadeias produtivas e mercados contra riscos climáticos.

Em geral, o financiamento para adaptação se sobrepõe ao financiamento para o desenvolvimento, já que muitos investimentos feitos para reduzir a vulnerabilidade econômica ou social de comunidades também contribuem para sua resiliência climática – além de trazer outros benefícios. No entanto, para que um recurso seja classificado como financiamento para adaptação, deve ter o objetivo explícito de aumentar a resiliência frente a riscos climáticos reais ou previstos.

Por exemplo, financiar a construção de uma nova estrada pode, de fato, aumentar a resiliência de uma comunidade, facilitando o o a mercados, hospitais e assistência durante eventos climáticos extremos. Mas, para que esse investimento seja considerado financiamento para adaptação, a estrada precisa ser construída com a intenção clara de lidar com os impactos climáticos e atender às necessidades de populações vulneráveis. Uma análise de vulnerabilidade pode indicar que a estrada precisa ser mais resistente, para que pessoas que vivem em assentamentos informais possam evacuá-la com segurança antes de tempestades severas. Ela também deve ser construída fora de áreas diretamente expostas a ressacas e erosão, ou então elevada, para continuar transitável em caso de enchentes.

Rodovia parcialmente submersa na província de Chiang Rai, na Tailândia, após o Tufão Yagi em 2024
Rodovia parcialmente submersa na província de Chiang Rai, na Tailândia, após o Tufão Yagi em 2024. O financiamento para adaptação engloba atividades que aumentam a resiliência frente aos impactos climáticos, como a construção de estradas elevadas ou mais resistentes, capazes de ar melhor inundações e tempestades (foto: Boyloso/iStock)

2) Qual a quantia necessária?

Diversos estudos oferecem uma ideia geral da quantidade de recursos que os países em desenvolvimento precisam para se adaptar às mudanças climáticas. O Relatório sobre o Gap de Financiamento para Adaptação do PNUMA, por exemplo, estima que são necessários entre US$ 215 bilhões e US$ 387 bilhões por ano até 2030. Já o Fundo Monetário Internacional (FMI) calcula que os custos de adaptação superam 1% do PIB anual em cerca de 50 economias de baixa renda e em desenvolvimento – e podem chegar a 20% do PIB em pequenas ilhas, mais vulneráveis a ciclones tropicais e à elevação do nível do mar.

Ainda assim, esses números são apenas estimativas. É difícil definir com precisão o montante necessário, pois isso exige uma análise detalhada dos riscos específicos de cada contexto, além de distinguir claramente as ações de adaptação de iniciativas de desenvolvimento mais amplas e aprimorar a coleta de dados. Além disso, a incerteza sobre os rumos futuros das mudanças climáticas dificulta ainda mais esse cálculo, já que o volume necessário de recursos também depende dos avanços coletivos, em escala global, para conter o aumento da temperatura.

3) Quanto está disponível?

Mesmo com dados ainda limitados, uma coisa é evidente: o financiamento disponível hoje está longe de atender às necessidades dos países.

A Climate Policy Initiative (I) estima que, em média, foram gastos US$ 68 bilhões por ano em adaptação no mundo entre 2021 e 2022. Grande parte desse valor vem de financiamento internacional: segundo a OCDE, os países desenvolvidos destinaram US$ 32,4 bilhões em financiamento para adaptação a países em desenvolvimento em 2022.

Esses níveis de financiamento estão muito abaixo do necessário – e a lacuna tende a aumentar à medida que os impactos das mudanças climáticas se intensificam. No total, estima-se que o déficit entre o financiamento atual e o necessário para adaptação em países em desenvolvimento seja de US$ 187 bilhões a US$ 359 bilhões por ano.

4) Quem está – e quem não está – recebendo financiamento para adaptação?

As evidências mostram que o financiamento disponível não tem chegado às populações mais vulneráveis ao clima, justamente as que possuem menos recursos para se adaptar. Segundo a OCDE, entre 2016 e 2022, os países de baixa renda receberam menos de 10% do financiamento climático mobilizado e fornecido pelos países desenvolvidos. Dados dos quatro principais fundos multilaterais para o clima – Fundo de Adaptação, Fundo de Investimento Climático, Fundo Verde para o Clima e Fundo Global para o Meio Ambiente – também indicam que os países mais frágeis e vulneráveis recebem menos recursos do que outras nações.

 

 

Um dos possíveis motivos para isso é que, para ar esses recursos, os países precisam de um alto nível de capacidade institucional. Embora os requisitos variam conforme o tipo de recurso, os processos costumam ser complexos, demandando profissionais qualificados, dados confiáveis e conhecimento técnico para estruturar propostas viáveis e atrativas para os financiadores. Os países menos desenvolvidos, apesar de serem os que mais precisam, em geral não dispõem dessas qualificações. Além disso, os altos custos de capital – impulsionados por fatores como riscos cambiais e instabilidade política – dificultam ainda mais o o ao financiamento.

5) Por que a mitigação climática recebe mais financiamento do que a adaptação?

Apesar do aumento nos últimos anos, o financiamento para adaptação ainda representa menos de 10% dos investimentos climáticos globais. A maior parte vai para ações de mitigação, voltadas à redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e contenção do aquecimento global.

Existem diversas razões para essa disparidade. A mitigação tem um escopo mais fácil de definir e mensurar: reduzir GEE é um objetivo claro e direto. Além disso, as iniciativas de mitigação costumam gerar retornos financeiros mais rápidos e previsíveis – como a instalação de painéis solares ou a produção de veículos elétricos –, ao contrário de muitos projetos de adaptação, cujo foco é fortalecer a resiliência a longo prazo diante de eventos extremos que podem ocorrer no futuro. Outro fator é que, como as emissões afetam o planeta inteiro, os países se sentem mais motivados a financiar ações de mitigação em outras nações, já que o benefício é global.

6) Por que é difícil monitorar o financiamento para adaptação?

O rastreamento do financiamento para adaptação é desafiador porque a adaptação é altamente específica ao contexto. Diferente da mitigação, que abrange um conjunto mais de soluções para reduzir GEE, a adaptação envolve uma ampla variedade de ações focadas nas vulnerabilidades e riscos climáticos de cada região.

Existem diferentes métodos para monitorar esse tipo de financiamento. Dois dos mais utilizados são os Marcadores do Rio, da OCDE, e a Metodologia Conjunta dos Bancos Multilaterais de Desenvolvimento. Ambos avaliam se um investimento contribui para aumentar a resiliência climática e em que medida, embora com abordagens distintas.

Alguns países também criaram seus próprios sistemas de rastreamento de gastos com adaptação, muitas vezes baseados nessas metodologias, mas adaptados à realidade nacional. Isso dificulta a comparação direta entre os dados dos diferentes países.

Mesmo com as metodologias disponíveis, o monitoramento ainda é complexo, pois exige recursos financeiros e capacidade técnica que nem todas as organizações possuem. Além disso, os gastos com adaptação muitas vezes estão espalhados por diferentes departamentos ou projetos, demandando coordenação adicional.

Monitorar investimentos privados é ainda mais complicado. Ao contrário do que acontece com os recursos públicos, os governos não possuem sistemas centralizados para contabilizar os investimentos do setor privado em adaptação. Como resultado, praticamente nenhum país sabe com precisão o quanto o setor privado investe em adaptação, seja dentro ou fora de suas fronteiras.

7) Os países em desenvolvimento estão recebendo apoio financeiro para adaptação?

A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (UNFCCC) regula o processo pelo qual os países cooperam para enfrentar a crise climática. Dentro desse acordo, os países desenvolvidos se comprometeram a apoiar financeiramente os esforços de adaptação dos países em desenvolvimento – historicamente, os que menos contribuíram para as mudanças climáticas, mas ainda assim os que mais sofrem com seus impactos.

Esse compromisso levou à criação de importantes fundos climáticos internacionais, como o Fundo de Adaptação e o Fundo Verde para o Clima, que canalizam recursos para países em desenvolvimento. Também foi acordado, no âmbito da UNFCCC, que os países desenvolvidos dobrariam o financiamento para adaptação em relação aos níveis de 2019, chegando a cerca de US$ 40 bilhões até 2025. Em 2022 (ano dos dados mais recentes disponíveis), esse valor atingiu US$ 32,4 bilhões, o que indica que os países estão relativamente no caminho para cumprir essa meta.

Na Gâmbia, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) apoia agricultores no desenvolvimento de métodos mais resilientes a impactos como o aumento das temperaturas e a irregularidade das chuvas
Na Gâmbia, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) apoia agricultores no desenvolvimento de métodos mais resilientes a impactos como o aumento das temperaturas e a irregularidade das chuvas. O financiamento internacional é vital para que países em desenvolvimento possam implementar ações de adaptação climática (foto: UNEP/Flickr)

Na Conferência do Clima da ONU de 2024 (COP29), os países estabeleceram um novo marco: o Nova Meta Coletiva Quantificada (NCQG, na sigla em inglês) de financiamento climático. Ficou acordado que os países forneceriam US$ 300 bilhões (com esforços para atingir até US$ 1,3 trilhão) para ações climáticas em países em desenvolvimento até 2035, buscando equilíbrio entre financiamento para mitigação e adaptação. A nova meta também destaca a importância de melhorar a qualidade do financiamento para adaptação, com foco em doações e recursos altamente concessionais, que não agravem o endividamento dos países vulneráveis.

8) Qual parcela do financiamento para adaptação é proveniente do setor privado?

Embora seja particularmente difícil monitorar o financiamento privado para adaptação, os dados disponíveis mostram que ele ainda é bastante limitado. Segundo a Climate Policy Initiative, aproximadamente 90% do financiamento para adaptação identificado vem de fontes públicas.

Isso ocorre por diversos motivos. Projetos de adaptação costumam trazer benefícios sociais amplos, mas o retorno financeiro direto nem sempre fica claro para os investidores privados. Além disso, muitas comunidades vulneráveis vivem em áreas consideradas de alto risco, como regiões afetadas por conflitos ou instabilidade. Em outros casos, o investimento privado em resiliência não ocorre por falta de planejamento de longo prazo, de capacidade técnica ou de dados confiáveis – ou até mesmo pela incerteza sobre quais opções de adaptação são mais eficazes.

No entanto, é fundamental aumentar a participação do setor privado, pois apenas recursos públicos não serão o suficiente para suprir o déficit de financiamento para adaptação e atender à crescente demanda por resiliência climática. Empresas privadas são responsáveis por financiar, construir e manter infraestruturas essenciais, cadeias de valor e mercados. Por isso, é fundamental que integrem a resiliência climática em suas decisões de investimento e explorem instrumentos inovadores para ampliar a colaboração com o setor público. Os governos podem facilitar esse processo oferecendo incentivos e mecanismos de compartilhamento de riscos para atrair mais investimentos privados em ações de adaptação.

9) Como o financiamento para adaptação tem sido fornecido?

A maioria – cerca de 76% – do financiamento para adaptação destinado a economias emergentes e países em desenvolvimento (com exceção dos países menos desenvolvidos) é fornecida na forma de financiamento não concessional. Já os países menos desenvolvidos tendem a receber a maior parte de seus recursos na forma de subsídios. Alguns países optaram por recusar empréstimos para atividades relacionadas ao clima, a fim de evitar o aumento de suas dívidas. Quaisquer esforços para ampliar o financiamento para adaptação também devem garantir que o tipo certo de recurso seja direcionado aos tipos certos de projetos.

10) Qual é a relação entre o financiamento para adaptação e o financiamento para perdas e danos?

O financiamento para perdas e danos – impactos climáticos que vão além dos efeitos aos quais as pessoas podem se adaptar – é um ponto importante nas negociações climáticas. O financiamento para perdas e danos e o financiamento para adaptação estão intimamente relacionados, já que ambos buscam ajudar comunidades a lidar com os custos associados aos impactos do clima. A principal diferença entre os dois é que o financiamento para adaptação visa ajudar as comunidades a se preparar e reduzir os impactos potenciais, enquanto o financiamento para perdas e danos serve, principalmente, para cobrir prejuízos que ocorrem apesar dos investimentos em resiliência. Investir em adaptação climática pode ajudar a reduzir os custos com perdas e danos no futuro.

Próximos os para aumentar o financiamento para adaptação

Aumentar o financiamento para adaptação exige compromissos políticos mais sólidos e maior capacidade institucional, tanto no setor público quanto no privado. Também é essencial melhorar os dados sobre os riscos econômicos e sociais trazidos pelas mudanças climáticas, bem como sobre os retornos financeiros e econômicos dos projetos de adaptação. Essas informações podem ajudar governos, doadores e o setor privado a entrar em acordo sobre as prioridades de adaptação, monitorar o financiamento e integrar essas prioridades nos planejamentos nacionais.

A COP30, que será realizada em Belém, no Pará, é uma oportunidade crucial para reforçar o papel do financiamento para adaptação, aproveitando o impulso recente para garantir compromissos mais sólidos e reduzir o déficit global de financiamento. Em Belém, o atual anfitrião da COP e o anterior apresentarão um roteiro para alcançar a meta de US$ 1,3 trilhão estabelecida pela Nova Meta Coletiva Quantificada, que se espera fornecer orientações claras sobre como ampliar o financiamento para adaptação. Os negociadores também decidirão sobre um conjunto de indicadores para monitorar os avanços referentes à Meta Global de Adaptação do Acordo de Paris. A inclusão de indicadores financeiros confiáveis é essencial para responsabilizar os países por suas metas e promover mudanças reais para as populações que estão na linha de frente da crise climática.

Durante a COP30 e nos anos seguintes, os países devem aumentar o financiamento para adaptação, tanto para apoiar as nações que já sofrem com os efeitos das mudanças climáticas quanto para se preparar para os impactos que ainda estão por vir. Trata-se de um investimento estratégico que, por meio de amplos benefícios sociais, econômicos e ambientais, contribuirá para a estabilidade e prosperidade global.


Este artigo foi publicado originalmente no Insights.